Na nova edição da Backstage Mag, a capa é estrelada por uma artista que transborda talento, intensidade e versatilidade: Anna Dalmei. Atriz, roteirista e co-diretora, ela acumula uma trajetória internacional marcada por projetos potentes e sensíveis — como o curta “A Cura”, premiado com o Leão de Bronze em Cannes por sua abordagem corajosa sobre a “cura gay”. Natural de São Paulo, Anna vive um momento de consolidação artística e revela, na entrevista, detalhes emocionantes e inspiradores da sua jornada.
Desde o primeiro contato com o palco ainda na adolescência, até os bastidores de projetos recentes como a série El Regreso de mi Esposo a la Grandeza e o longa Horrorscope, Anna compartilha seus aprendizados, desafios e descobertas vividos em diferentes culturas e idiomas. A convivência com equipes multiculturais, segundo ela, ampliou suas perspectivas e alimentou uma arte mais empática e plural.
Em conversa, Anna também reflete sobre o papel transformador da arte, a importância do cinema nacional e a constante busca por referências profundas — como o romance O Idiota, de Dostoiévski, que atualmente a inspira. Com um olhar sensível e uma paixão genuína pelo ofício, ela mostra que estar em cena vai muito além da performance: é um compromisso com histórias que importam e que provocam reflexão.
Confira a entrevista completa agora:
Anna, você já viveu e trabalhou em diferentes partes do mundo. Mas gostaria de começar te perguntando: como foi o seu primeiro contato com a atuação?
Meu primeiro contato foi na escola. Minha escola era muito artística, no sentido de que tínhamos muitos projetos de peças, esquetes, apresentações, etc. Então a primeira vez que subi num palco foi entre meus 12-13 anos. E nunca mais parei.
Em que momento você percebeu que queria transformar a arte em profissão?
Eu sempre soube que faria isso de alguma forma. Lembro de assistir a um filme aos seis anos e pensar “quero fazer isso também”. Mas só consegui ir atrás de treinamento profissional aos 17-18 anos, quando entrei no primeiro curso profissionalizante de atuação.
Você se lembra dos primeiros trabalhos como atriz? Conta um pouco pra gente?
Lembro da primeira peça que participei: “A aurora da minha vida”, de Naum Alves de Sousa. Me recordo do nervosismo de não conseguir entregar o que eu precisava entregar, lembro de ter medo… e de terminar a peça pensando: é isso que eu quero fazer pro resto da minha vida mesmo. A semente tinha sido plantada há um tempo, mas a certeza veio ali. Acho que a primeira peça, o primeiro filme, novela, série, etc., a gente acaba guardando com muito carinho no coração. É o primeiro amor artístico: é quando nos apaixonamos pela profissão e tudo muda!

“A Cura” foi um projeto que teve uma recepção muito forte e foi premiado em Cannes com o Leão de Bronze. Como foi dar vida a esse projeto?
Acho que foi um dos projetos mais desafiadores dos quais fiz parte. E sem demagogia, viu?
Você dar a vida a uma personagem tão diferente de você é sempre maravilhoso e assustador nas mesmas proporções. A temática é pesada, a personagem era densa, a mensagem por trás é forte… Foi um projeto muito difícil, mas agregador demais.
O filme traz uma denúncia muito necessária sobre as violências da “cura gay”. Qual foi o retorno do público em relação à história?
Pelo que pude acompanhar, o filme teve uma repercussão muito positiva. Várias pessoas que fazem parte da comunidade LGBTQIAPN+ também doaram seu tempo para falar sobre suas experiências, o que é sempre muito agregador e importante. Caso tenha interesse em conhecer o projeto, acesse o perfil no Instagram @fimdacura. Na bio do perfil tem um link para o abaixo-assinado também!
Você carrega muitas experiências diferentes em outros países. A convivência com outras equipes multiculturais influenciou sua forma de trabalhar?
Acho que influenciou sim. Você passa a enxergar fora da bolha, né? É muito prático você fazer arte com pessoas com a mesma realidade que a sua, a mesma visão artística, as mesmas referências etc. A partir do momento que a gente se desvencilha da zona de conforto, parece que um mundo novo se abre, então qualquer coisa que te faça ampliar repertórios é extremamente bem-vinda.
Além de atuar, você também escreve, dirige e modela. Como é equilibrar essas diferentes facetas dentro da sua carreira?
Eu sou péssima pra conciliar meu tempo (risos). Eu tento separar ao máximo tempo pra fazer todas as coisas que gosto, mas dificilmente tenho sucesso. Acredito que preciso aprender muito mais antes de me intitular diretora ou roteirista. Sobre a modelagem, eu acho uma profissão muito incrível, mas não posso me dizer modelo, até por respeito a todos os profissionais dessa área que estudam e trabalham tanto pelas carreiras. Já fiz algumas coisas no passado e gostei muito, mas não posso falar que sou modelo. De qualquer forma, sigo estudando muito e acompanhando profissionais da área para um dia, quem sabe, eu conseguir de fato incluir essas outras áreas integralmente ao meu currículo.
O que você pode nos contar sobre os bastidores da série “El Regreso de mi Esposo a la Grandeza”?
Até agora, foi o projeto mais diferente que participei. Por ser uma série vertical, o ritmo de filmagem é bem diferente. Éramos em muitas nacionalidades latinas, e foi delicioso participar de um projeto de comédia onde tínhamos liberdade de explorar linguagens mais próximas da commedia dell’arte, por exemplo. Foi maravilhoso estar ali.
“Horrorscope” é um longa-metragem que está em pós-produção e você atuou como co-diretora. Conta um pouco como foi estar no set deste trabalho?
Foi um processo tão gostoso! Eu posso dizer que durante esse processo ganhei amigos para a vida. Estar em um ambiente artístico que não te poda, mas te encoraja a desbravar é muito bom. E sinto que cresci muito aprendendo com esses profissionais incríveis. Espero poder trabalhar mais ainda com eles futuramente!

Você disse que o artista precisa se rechear de referências culturais. Quais são algumas das mais recentes que te tocaram ou inspiraram?
Eu estou em um processo muito lento e profundo atualmente com “O Idiota”, de Dostoiévski. É o tipo de livro que tem que ser lido com calma, sabe? E esse livro está tendo uma impressão muito forte em mim. Acredito que esse livro é uma das referências que mais me tocou no último mês.
Você comentou sobre a importância do reconhecimento do cinema nacional no Brasil. Qual sua visão sobre esse ponto no atual momento?
Acredito que o cinema nacional dá, a cada dia, um passinho rumo ao reconhecimento que merece. Já sabíamos de nossa potência e grandiosidade há muito tempo, e atualmente o mercado internacional pareceu entender que somos tão grandes quanto qualquer outro mercado. Vemos pelos prêmios internacionais que cada vez mais têm em suas listas nomes nacionais. Meus votos são de que levemos a arte e a cultura cada vez mais a sério, e que percebamos que ela nos movimenta, nos instiga e nos engrandece.
Quais artistas ou diretores brasileiros você gostaria de trabalhar junto?
Tenho um amor imenso pelos artistas brasileiros, e de verdade sinto que trabalhar com qualquer artista do nosso país é uma honra enorme. Não consigo escolher um ou uma: terei muita sorte de conviver e aprender com qualquer artista brasileiro, e espero poder honrar cada um sempre.
+ There are no comments
Add yours